O Brasil segue falhando de forma alarmante na proteção de suas crianças. Dados revelam que, em 2023, quase 14 mil meninas entre 10 e 14 anos deram à luz no país, um número que, por si só, escancara uma triste realidade: essas meninas são, majoritariamente, vítimas de violência sexual.
A legislação brasileira é clara. Toda relação sexual com menores de 14 anos é considerada estupro de vulnerável, independentemente das circunstâncias, consentimento ou vínculo com o agressor. Portanto, todas essas gestações são, legalmente, frutos de um crime. A lei também assegura que essas meninas têm direito ao aborto legal, seguro e gratuito, oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
No entanto, os números mostram um abismo entre o que está na lei e o que se concretiza na vida dessas meninas. Apenas 154 delas conseguiram acessar o aborto legal, ou seja, apenas 1,1% das vítimas conseguiram exercer esse direito. As razões são múltiplas, mas a negligência, a desinformação, o preconceito e a omissão de serviços públicos são protagonistas desse cenário.
Por lei, todos os casos de gravidez infantil devem ser obrigatoriamente notificados ao Ministério da Saúde e às autoridades de segurança pública, justamente porque configuram estupro presumido. E mais: é dever dos profissionais de saúde informar, de forma clara e imediata, que essas meninas têm direito a interromper a gravidez. Na prática, isso muitas vezes não acontece.
Além do trauma da violência sexual, milhares de meninas são condenadas a enfrentar uma gravidez precoce, um processo que coloca em risco sua saúde física, mental e social, além de comprometer seu desenvolvimento escolar, emocional e econômico. Isso se agrava pela escassez de hospitais habilitados e preparados para realizar o procedimento de interrupção legal da gravidez.